Já?!?

Em pouco tempo a decisão foi tomada, ao menos pareceu pouquíssimo o tempo entre a decisão e o dia fatídico. Aos poucos, tudo que tinham, toda uma vida estava dentro de caixas de papelão, sendo encaixadas dentro de um caminhão e ele era grande, como era, nunca tinha visto um daquele tamanho. Observou, uma por uma, as caixas sendo levadas por desconhecidos... ficou com pena dos passarinhos, seu pai devia ter pelo menos 100 deles... ah, os canarinhos que cantavam todas as manhãs em gaiolas tão pequenas, agora estavam sendo mais uma vez trancafiados, uma gaiola dentro de outra. Tinha pena deles, sonhava em abrir cada uma das portinhas e deixa-los voar alto, cantando a liberdade, não teve coragem, nunca teve!!

Caminhão equipado, pronto pra viagem. O pai foi junto, para cuidar das pobres aves que no escuro, necessitavam de comida, água e ar de vez em quando. Elas ficaram, apenas alguns dias a mais, se despediram do colégio, que uns anos antes, seus pais ajudaram a construir... deram adeus a seus amigos, sim, adeus, ainda não sabiam, mas nunca voltariam a se ver... se perderiam entre cartas e caminhos. Os vizinhos, com quem dividiram boa parte da vida e das brincadeiras, foi difícil.

Naquela noite, em meio ao transito louco de São Paulo, chegaram atrasados a rodoviária. Mal conseguiram se despedir do gentil casal de "compadres" que as levou até lá. Tiveram que entrar as pressas no ônibus e dali, da janela, acenaram...

Acenaram para o casal, para o tumulto, para a criminalidade que tomou conta da vida de alguns amigos que hoje morreram ou estão presos. Se despediram do ar poluído e do transito, já naquela época, infernal! Pela janela vi as favelas, os muros pixados, os moradores de rua ficando para trás... vi também uma nova vida começando, em uma cidade ainda pequena.

Hoje, agradeço aos meus pais por esta mudança, crescer em uma cidade pacata não tem preço. Hoje, depois de 15 anos, me considero catarinense de coração.

*Créditos a minha irmã, que nos lembrou que hoje, fazem 15 anos que moramos em Blumenau*